quarta-feira, 23 de julho de 2014

País, Família, Pessoa, Futebol

Mauro Romero Leal (especial para o CASA DA GENTE)

Dr. Mauro Romero Leal Passos e seu filho caçula Gabriel, de 8 anos
(Foto Acervo Pessoal)
Um país, uma família, uma pessoa se constrói com vitórias e derrotas. Ambas, vitória e derrota não são definitivas. Ambas são necessárias. Ambas vão sempre coexistir. É a vida. E a vida é para ser vivida. Sofrida. Amada. Como uma mãe que dá luz a seu filho.
Com ambas, vitória e derrota podemos aprender, crescer. Se for o nosso desejo. Um jogo de futebol, uma Copa do Mundo é muito importante. Mas, não deve ser maior do que a capacidade e a tranquilidade para consolar uma criança em prantos que assiste o seu time perder. Não pode ser maior do que o entendimento de que seres humanos cometem falhas. E que além de apontar falhas devemos criar condições para as correções. Chutar um cachorro morto pode ser fácil. Querer uma “selfie” com um famoso que está com uma medalha no peito pode ser mais fácil, ainda. Todavia, para ser um verdadeiro vitorioso temos que apoiar e estender a mão para quem sofre uma queda. Para quem está no chão isso não é esquecido. Para quem deu apoio, uma sensação de felicidade toma conta do coração e da alma. Faz um bem!
Por outro lado, o sofrimento, o luto, pode gerar muitos bons frutos. Muitas vitórias. Muitas alegrias.
Certa vez uma paciente me disse: “Eu agradeço todos os dias por ter contraído HPV. Por ter pego HPV aprendi muito na vida. Aprendi como falamos e ouvimos coisas erradas...”
De Betinho (Herbert de Sousa) ouvi: “Eu não queria ter aids, mas já que ela veio eu vou lutar para que outras pessoas não passem o eu passo. Eu vou transformar esse grave problema em grandes oportunidades”.
Em certo momento da vida, década de 1970, para ter o meu próprio dinheiro eu fui procurar emprego no comércio. Fui rejeitado para a função de escrever notas fiscais.
No instante seguinte de ouvir a palavra não eu me senti o mais incompetente dos jovens. Não consegui um emprego de tirar notas fiscais.
Em casa, minha mãe falou: “Quem perde são eles, que não te empregaram”.
Em outro momento, de uma turma de especialistas em ginecologia fui o único reprovado para ingressar no curso de mestrado. No ano seguinte, entrei no curso e acabei terminando o mestrado, e o doutorado, na frente de quase todos os outros da minha turma.
Hoje, sou médico, professor, escritor de livros médicos, diretor de uma editora de uma universidade federal, editor de um periódico científico internacional. Daquelas e de tantas outras derrotas que tive na vida (e foram muitas) tirei forças, dedicação para na frente, alcançar novos objetivos.

O Brasil é o país do futebol, de pentacampeões mundiais, de Pelé...
Da Fórmula 1, de Ayrton Senna, de Emerson Fittipaldi...
Do Samba, de Cartola, de Adoniran Barbosa, de Martinho da Vila...
Do Chorinho, de Pixinguinha...
Da Música popular, de Tom Jobim, de Chico Buarque, de Caetano Veloso...
De Boas músicas clássicas, de Villa-Lobos...
Das Artes, de Fernanda Montenegro, de Paulo Autran, de Glauber Rocha...
Das Formas, de Oscar Niemeyer, de Cândido Portinari, de Di Cavalcanti, de Tarsila do Amaral
Das Letras, de Carlos Drummond de Andrade, de Jorge Amado, de Vinicius de Moraes...
Da Saúde pública, de Oswaldo Cruz, de Carlos Chagas, de Vital Brazil...
Da Medicina, de Ivo Pitangui, de Eurycrides Zerbini...
Das Ciências, de Paulo Freire, de Gilberto Freyre, de Anísio Teixeira, de Cesar Lattes...
Da Aviação, de Santos Dumont...
Da Luta para preservação da natureza, de Chico Mendes...
Da Preservação dos índios e de sua cultura, de irmãos Villas Boas...
Da Luta contra a aids, de Betinho...
Do Futevôlei, do futebol de salão, da altinha, da canga, do frescobol, da jabuticaba, da caipirinha... da floresta amazônica, pulmão do mundo...
Um país não se constrói com alguns heróis. Os heróis apenas nos inspiram, para que todos cumpram, com eficiência, honestidade, liberdade, igualdade, fraternidade, amizade os papéis que representam em uma sociedade democrática.
O Brasil é país de um povo feliz, que sabe, até, fazer alegria de suas adversidades. Que sabe aplaudir as vitórias merecidas.
Da liberdade de poder expressar os mais diversos sentimentos. Para contrapor argumentos. Para ampliar pensamentos.

(Mauro Romero Leal Passos é brasileiro, 60 anos, casado, pai de cinco filhos)
 

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